#000143 – 08 de Abril de 2020
O Black Metal já não é o que era. Oathbreaker conta com o carisma, a voz e até a sensualidade feroz de Caro Tanghe. Panopticon mistura bluegrass, guitarras folk, banjos e extrema esquerda com a obscura desolação deste género de metal. “Rheia”, dos Oathbreaker, faz lembrar “The Ark Work”, dos Liturgy, lançado um ano antes, em 2015. Ambos são melancólicos, experimentais, audazes e com zero por cento de preocupação com a tradição iniciada no norte da Europa. Horseback é, para o Black Metal, o que Clutchy Hopkins é para o Hip-Hop. Retira-se o rap do Hip-Hop e temos álbuns como “The Life of Clutchy Hopkins”. Retira-se a voz fria e rasgada, o blast beat e os riffs acelerados ao Black Metal e fica ainda algo. Fica um elixir de intensa simplicidade. Canções de uma sensibilidade bizarra, um destilamento feito paisagem e pulsação, como “Tyrant Symmetry”. O álbum a meias de Horseback com os extraordinários Locrian tem o apropriado nome “New Dominions”.
E na segunda década deste século abriram-se ainda mais espaços de mestiçagem e experimentação. Os Cara Neir juntam muitos sabores de punk e death metal à sua interpretação do Black Metal. Os Usnea usam o Black Metal como ingrediente especial do seu doom, raras e preciosas vezes. Os Khanate deixaram um herança interessante no doom, que poderá ou não fragmentar uma influência, restrita mas importante como os Naked City semearam noutras décadas. Os Krallice elevaram o Black Metal a um patamar de composição e execução que poucos imaginariam e muitos, na verdade, desprezam. Tudo, neste dos muitos projetos de Mick Barr, soa a Black Metal. Não há vestígios do prefixo post-. Mas a voz abafada, a mistura imprecisa de todos os instrumentos, a ofegante arritmia ocasional da bateria, este som característico do género com baixíssima ou nenhuma produção, é usado com mestria.
O Black Metal, repugnando muitos dos seus seguidores de longa duração, tornou-se finalmente um estilo, um género, uma estética, uma história. Isso significa agora que, como todos os outros géneros musicais antes, será avidamente desmantelado, reapropriado, reinterpretado, misturado. Venha esse futuro desconcertante.