#000240 – 14 de Julho de 2020

A compaixão é mais importante que a empatia. Ambas têm a sua função. Scott Barry Kaufman diz que empatia é sentir o mesmo que alguém e compaixão é sentir com alguém. Robert Sapolsky dá um exemplo perturbador numa das suas palestras no seu curso em Stanford. Para combater a violência policial, um programa pioneiro foi implementado em algumas esquadras nos EUA. Agentes da polícia receberam um tratamento com oxitocina. O resultado foi um sucesso e um fracasso enorme. A empatia realmente aumentou, mas de forma indesejável. Os agentes que tinham recebido o tratamento simplesmente passaram a ter mais empatia com os colegas acusados de brutalidade policial. Infelizmente, esta ciência poderá vir a ser uma arma hormonal militar, para fazer os soldados ainda mais “leais” ao soldado a seu lado e, por isso, mais mortíferos e implacáveis.

A compaixão, que Kaufman afirma acender partes do cérebro diferente, permite-nos algo diferente. Prepara-nos com emoções e instiga comportamentos para transpor o limite das nossas relações mais próximas, do nosso grupo. Por isso é possível sentir compaixão por quem não gostamos. Podemos ser compassivos mesmo com alguém que tenha um comportamento que condenamos. Sentir com essa pessoa não é sentir o mesmo, não é passar a ter o mesmo comportamento.

Os momentos em que sentimos ou recebemos compaixão por alguém com quem há uma ligação empática podem curar feridas profundas. Ou ser mesmo experiências de intimidade espiritual, romântica, instantes de amor mútuo. Mas somos mais que os nossos sentimentos e emoções. Eles não são verdadeiros, não porque sejam mentira. Mas porque não podem ser falsificáveis. Dizer uma verdade é dizer o contrário de uma respectiva falsidade. Mas “estar triste”, “estar zangado”, “sentir-se ofendido”, “sentir-se desconfortável” não tem esse reverso. Não há mentiras emocionais, apenas emoções. As emoções não são legítimas nem ilegítimas. Trata-se de eventos pessoais, não de verdades universais. E é sobre estas últimas que construímos o mundo, que é de todos.