#000258 – 01 de Agosto de 2020
Tristan Garcia diz que o real não precisa de nós. “Le réel n'a pas besoin de nous”. Mas acrescenta: a ficção não se opõe ao real. A ficção é um outro real, é a construção do real. A diferença é que a ficção precisa de nós. A seguir, distinguindo dentro da ficção a ficção artística da ficção religiosa diz: a ficção religiosa é um tipo de ficção que se apresenta como algo que não é ficção e não precisa do humano.
Quando se refere à literatura fala da literatura do real e da literatura do imaginário. Esclarece que ambas são ficção, uma é ficção do real e outra ficção do imaginário.
A ficção do real é a que acredita que estamos dominados pela ficção e que por isso há que produzir o real. Garcia parece ir ao encontro do que disse J. G. Ballard: “For the writer in particular it is less and less necessary for him to invent the fictional content of his novel. The fiction is already there. The writer's task is to invent the reality.” Garcia acrescenta que esta ficção continua a acreditar que o real precisa de nós. Algo que diz ser paradoxalmente idealista.
Para Tristan Garcia, a ficção do imaginário (sci-fi e fantasia) acredita que estamos dominados pelo real, e por isso há que produzir o imaginário. Aqui perde-se um pouco, fala dos surrealistas, das críticas de Breton ao romance realista. Caricatura esta posição, “Pourquoi s'embêter avec le réel une fois que le réel est déjà lá?”.
Estou do lado de J. G. Ballard e de Ursula K. Le Guin. É Graham Harman quem me vale. A arte, explica Harman, diz o que não é possível dizer diretamente. Se levássemos à letra uma metáfora, deixaria de fazer sentido. A arte trata da realidade. Eu, como Ballard, acredito que é preciso ocupar-nos do real, contra as ficções que nos dominam. E, como Ursula K. Le Guin defendeu, a literatura do imaginário está em excelente posição para o fazer.