#000281 – 25 de Agosto de 2020

China Miéville fala do período médio de um escritor. Diz que habitualmente se estuda o autor em início de carreira ou a sua fase de maturidade. Mas falta tudo o que está entre o início e o fim. Dá o exemplo de J. G. Ballard, considerando-o um escritor que, no seu período médio, desmantelou o que tinha sido a sua obra inicial. Miéville diz que, entrando agora no seu período médio, se interessa pelo formato novela, por oposição aos romances imensos que escreveu inicialmente. Chega a dizer que acredita que a melhor novela é sempre melhor que o melhor romance. Num romance, diz, há mais espaço para as coisas correrem mal e geralmente correm. Sugere que é muito apelativa, numa novela, a proximidade da perfeição.

Diz o autor inglês que “This Census Taker” é o seu melhor livro. Estou a tentar lê-lo pela segunda vez. É, pelo menos nas primeiras páginas, uma história opaca, cinzenta como “The Wasp Factory”, de Iain Banks. Opacidade é mesmo expressão de Miéville, que diz interessar-lhe a ideia do que não é possível dizer e que faz sentido que uma personagem se mantenha opaca, até para si mesma, tal como as pessoas são, realmente. Ambas as narrativas têm como protagonista uma criança, cuja narração na primeira pessoa é dissonante em relação à realidade a que se refere. Mas, curiosamente, o curto romance de Banks foi o seu livro de estreia. E a seguir escreveu longos romances, com sentido de humor e tom épico.