#000487 – 18 de Março de 2021
Resmungão. Nos muitos meses que estive sozinho a trabalhar num apartamento noutro país, aprendi a resmungar. Descobri-me rezingão, dado a queixumes e impaciências, impulsivo no expressar de frustrações. Talvez a aprendizagem social seja importante, nisto da gestão das emoções. Há um lado desse condicionamento, a que não se foge na proximidade com os outros, que ajuda a desfocar as atenções do ego. Não sendo confrontado com outras emoções, outras experiências e interpretações do mundo, a minha própria perspetiva ganha uma falsa centralidade e desmedida importância. Sobretudo porque é minha a vida, não é assim tão importante. É tudo o resto que me dá contexto do que se encerra em mim. São todos os outros que me importam, para o mundo que é meu. Regresso à civilização nisto das coisas pequenas. O silêncio, como me lembrou o Vítor Rua, é uma forma específica de som. Já o ruído é difícil de definir. Mas ao menos vou aprendendo que não é o barulho que me impede de insistir na autocomplacência. Essas distrações exteriores ao que sou têm um nome que nunca será banal: realidade.