#000762 – 29 de Setembro de 2021
Ciclismo artístico, flatland, trials, MTB slopestyle, bmx park. É espantosa a variedade de desportos de expressão realizados em cima de bicicletas. Neste mundo do ciclodesporto podemos ver a cisão que existe entre o ideal olímpico e a revolução que aconteceu quando o skate se tornou um desporto de popularidade mundial. Até essa altura, praticamente todos os desportos procuravam medir, de forma objectiva, quem é mais rápido ou mais forte. Mesmo em modalidades em que formalmente conta a expressão do atleta, como a patinagem artística, a necessidade de comparar atletas de forma precisa e sistemática sempre colocou um colete de forças sobre as possibilidades do que um atleta pode fazer durante uma prova. Basta comparar a patinagem no gelo freestyle (que tem inspiração dos patins em linha) com a patinagem artística, para vermos onde é que há liberdade de expressão, onde é que o vocabulário de movimentos está em constante expansão criativa.
Algumas modalidades, como o parkour, amadureceram sem sequer terem alguma prova competitiva. E quando começaram a haver competições, criou-se uma dinâmica como a que existe no surf, em que a prática livre, fora de competições, é um motor contínuo de inovação e reinvenção. Na ginástica ou na patinagem artística, isso não tem lugar. Para conseguir pontuação, simplesmente se tem de repetir o que é feito há décadas, de forma o mais perfeita possível. Algumas modalidades, pela indefinição das suas fronteiras e pela sua juventude, como o tricking, têm inovações diárias e ninguém consegue prever para onde é que a modalidade vai. Voltando às bicicletas. Aqui a própria evolução no fabrico das bicicletas e a constante hiperadaptação da bicicleta ao seu uso desportivo específico estão em diálogo constante com a evolução da perícia dos desportistas. Uma bicicleta de trials e uma outra de ciclismo artístico são engenhos absolutamente diferentes. É fácil de acreditar que outras modalidades estão por inventar.
O Cycle ball faz com bicicletas o que o Kayak-polo faz com kayaques: adapta a ideia genérica de um desporto de equipas em cujo objectivo é marcar golos com uma bola. O ciclismo artístico adapta a ideia da ginástica artística, com todos os movimentos feitos numa bicicleta em movimento. Ao vermos Ryan Williams a executar manobras de grande amplitude e perigo físico numa bmx, vemos a influência do snowbard e das trotinetes (em que Ryan Williams domina). Muitas outras influências e evoluções mecânicas poderão chegar ao mundo das bicicletas. E tudo isto sem falar dos veículos da mesma família: há quem dê a volta ao mundo num uniciclo, há bicletas todo-o-terreno, que se pedalam numa cadeira com quatro rodas, há bicicletas em que se usam os braços em vez das pernas, para transmitir movimento às rodas. E, claro, há a minha adorada Halfbike.