#000768 – 05 de Setembro de 2021
A tradição científica ensina-nos que um não ou um sim são igualmente bem-vindos. Quer uma teoria seja comprovada quer se prove que estava errada, um cientista celebra a descoberta. Nos dias de hoje, somos puxados por dois polos igualmente aberrantes, um que duvida sistematicamente de tudo e outro que acredita nas maiores idiotices. A mesma convicção delirante é necessária para um e para outro e chegam a confundir-se. Há dias, uma amiga falou-me duma entrevista a um líder de um movimento negacionista do vulcão Cumbre Vieja. Os tempos são tão estranhos que eu pensei que eram pessoas que não acreditavam que o vulcão, esse detalhe com dois quilómetros de elevação, que faz correr um enorme rio de lava até ao mar, não existia. Eram mais sofisticados estes negacionistas. Afinal, não acreditavam era na versão dos cientistas: que o vulcão simplesmente tinha entrado em erupção. Tudo não passava de uma conspiração. É admirável a ginástica racional de um ser humano que necessita de explicar a complexa operação clandestina que consegue com sucesso não só fazer um vulcão entrar em erupção, mas também enganar o mundo inteiro. Ao mesmo tempo é triste que alguém consiga acreditar em tal palermice. À força de duvidar de tudo, até da natureza, acredita-se na explicação mais improvável e desmiolada que é possível articular com linguagem humana. Queria tanto poder viajar ao futuro para ver a reação dos arqueologistas a estes momentos encantadores desta coisa que ainda agora começou e já deu nisto, chamada internet.