#000833 – 09 de Dezembro de 2021

Dizemos premonição mas queremos dizer predestinação. Dizemos determinismo mas queremos dizer predestinação. Seja com a crença supersticiosa nos poderes de adivinhação de alguém ou alguma prática, seja com a ideia filosófica de que tudo foi determinado por causas prévias, fazemos confusão. Adivinhar o futuro, ao menos para alguém que gosta de sci-fi, não é descobrir um resultado vindouro inalterável. Usando uma platitude como exemplo, adivinhar que um comboio vai para o Entroncamento não é ficar com a certeza que lá chega. O destino do comboio é o local para onde se dirige, não é a sua sina. Pode haver uma avaria ou acidente. Literariamente, é muito mais interessante a ideia de uma personagem que adivinha o futuro e, por isso mesmo, o altera. Em relação ao determinismo, o fundamento mais importante da ideia de que não existe livre arbítrio, de novo equívocos, desta feita mais graves. Segundo o determinismo, um efeito aconteceu precisamente porque foi desencadeado pelas suas causas e não por outras. Se outros eventos tivessem sucedido, outros resultados teríamos. A ideia de predestinação opõe-se à do determinismo. Algo predestinado acontecerá, por mais voltas que se dê. Se mil vezes se tentasse, com ações diferentes, mil vezes tudo seria igual no fim. A predestinação é a mais patética e improvável das ideias. Talvez, seria triste, hajam mesmo coisas predestinadas. A morte, poderão dizer, é uma delas. Mas mais curioso é haver tanta gente que encontra conforto na predestinação. Desde os clientes dos curandeiros e astrólogos até figuras iminentes como Zizek. Este último várias vezes repetiu em público que a única teologia eticamente interessante é a teologia da predestinação. Este apego ao que não se pode evitar, este conforto na calamidade vindoura, intriga-me. Um dia, hei-de saber perguntar porquê, talvez escrevendo uma história.