#001023 – 17 de Junho de 2022
Os livros são a forma lenta e persistente de transportar o conhecimento humano. Vem um autor e liga ou subverte ideias existentes. Uma nova investigação usa o que existe, nesta rede offline, propondo abolir ou reinterpretar conceitos estabelecidos. Cada livro novo é uma forma de reorganizar tudo o que existe. Mesmo sendo ínfimo, cria ligações e agitação suficientes para mudar ou reforçar algo. É um processo com muita entropia, com tantos momentos de reorganização como de desestruturação.
Esta recente forma algorítmica de lidar com informação é muito diferente deste uso humano, tão antigo como a escrita. Desde logo, é pragmática. Os dados são tratados para obter um resultado pré-definido. Tendencialmente, o resultado é quase a coisa que se conhece com precisão. Um dos exemplos é o de programas que “aprenderam” a reconhecer rostos, tendo sido alimentados de enormes quantidades de resultados e de dados por analisar. O programa “descobriu” forma de pegar dos dados e de os analisar e classificar para chegar aos resultados definidos pelos programadores. Mas os programadores não sabem, em detalhe, que caminho lógico, que detalhes computacionais foram seguidos pelo programa. Esta estratégia é usada em ferramentas que usamos quotidianamente, como o tradutor do Google. As nossas interações alimentam o programa, dando indicações de quão fiáveis são os resultados. Ora, isto tem aplicações práticas interessantes, mas faz pouco sentido vê-lo como o novo passo evolutivo do ser humano. Ou mais especificamente, a forma mais recente de lidarmos com conhecimento. Seria sensato também evitarmos demasiado a lógica de lidar com a tecnologia computacional como com um oráculo.
Descobrir é muitas vezes, tanto para as artes como para a ciência, encontrar o que não se procurava. Só sabendo muito bem o que estamos a fazer e de que forma o fazemos, podemos avançar, desta forma caótica e lenta. Ter um funil apontado a um resultado é um processo muito diferente, e de certa forma, até podemos dizer pouco racional. Os livros permitem descobrir que outras ferramentas existem, para além do funil. Estes métodos algorítmicos podem ser-nos mais úteis se os encararmos como uma ferramenta, entre outras. Recentemente, alguns programas resolveram, por puro poder de computação, alguns problemas matemáticos sem solução há algum tempo. Aquilo a que temos que prestar atenção é que, pelo menos por enquanto, um destes programas não tem capacidade de encontrar um problema. Os problemas são uma formulação humana, fruto da nossa imperfeita cognição e da grande consciência que temos das limitações do nosso entendimento.