#001094 – 29 de Agosto de 2022
Kalaripayattu e Yoga. Kung Fu e Tai Chi. É tão bizarro dizer arte marcial como seria dizer guerra artística. O que é ainda mais estranho é que estas artes do movimento, com o tempo, sobretudo se passou muito tempo, transformaram-se numa prática desportiva ritualizada, executada num fundo de espiritualidade e filosofia. As formas de combate modernas, tendo uma génese mais ligada ao desporto de entretenimento ou ao treino do soldado, são pragmáticas e agressivas. No karaté, o corpo que recebe, ukemi, é central, é isso que se treina, acima de tudo. Pensando em Sambo ou Krav magá, pensamos no corpo que ataca, num soldado a derrotar um inimigo, possivelmente a matá-lo. A história do Yoga e do Tai Chi estão ligadas à história das artes marciais, guerra gerou paz. Quando pensamos no UFC ou no jiujitsu brasileiro, pensamos em lutas de rua, em eficácia violenta. Até no Karaté e no Kung Fu surgiram estilos como o Kyokushin e o Wing Chun em que o pragmatismo leva ao foco no impacto da ação que se aplica no adversário. A beleza do Aikido é quase etérea, de tão diretamente artística e desligada da violência do combate. Escuta-se Bruce Lee a falar do seu Jeet Kune Do e pensa-se em situações reais em que precisamos de defender a nossa vida e no nosso corpo como uma arma mortífera. Talvez daqui a mil anos, se ainda existir, o MMA tenha dado origem a uma nova forma de meditação a dois, que incorpora contact improvisation. Mas por enquanto, fica esta sensação: é muito diferente a prática de algo que demorou centenas de anos a se diluir e refinar, deixando de ser combate e passando a ser outra coisa da prática de uma forma de luta em que técnicas existentes são aplicadas em situações reais de luta entre pessoas. Talvez no tempo dos samurais ou nas eras míticas em que monges se defendiam de salteadores, as artes marciais fossem o Sambo ou o Krav magá que havia à mão.