#001778 – 18 de Julho de 2024

A forma como o actual governo de Israel conseguiu obter um apoio quase incondicional dos Estados Unidos e da União Europeia mostra, entre outras coisas, como os fundamentos da política identitária falham tragicamente.

Mais ainda que apoio militar e político, o governo de Israel conseguiu que os governos seus aliados limitem de forma intensa e implacável qualquer manifestação de uma opinião contrária ao caminho actual, de genocídio, repressão e colonialismo levado ao extremo. Nos Estados Unidos e um pouco por toda a Europa, na Alemanha com uma intensidade alarmante, quem protesta pacificamente sofre violência policial, quem exibe uma bandeira da Palestina é removido do espaço público.

O governo de Netanyahu conseguiu instrumentalizar um dos mantras do activismo identitário: que só a vítima de opressão tem legitimidade para definir o que é opressão e que tudo aquilo que é apontado pela vítima como opressão o é obviamente.

Muitos judeus, por todo o mundo, estão na primeira linha dos protestos, sofrem cargas policiais e arriscam diariamente as consequências da sua resistência, em solidariedade com os palestinianos. Ainda assim, este governo israelita conseguiu convencer o mundo que é a máxima instituição que representa a voz dos judeus todos, a viver em Israel ou na diáspora, todos os que vivem ou já não estão entre nós. E que o mundo deve seguir à risca o seu regulamento sobre o que é ou não é anti-semitismo. E para Netanyahu qualquer opinião contrária às suas políticas é, obviamente, anti-semitismo.

Estou muito pessimista. Não acredito que consigamos, nos tempos que se avizinham, tirar lições disto. Temos até agora combatido opressão com opressão, intolerância com intolerância, ataques a liberdade de expressão com o escalar a esses ataques. Não vejo indícios de mudança. Temos de resistir, continuar solidários com todos os seres humanos que sofrem às mãos de exércitos invasores ou sob o jugo dos seus próprios governantes. E encontrar forma de manter lucidez argumentativa, abertura e respeito por quem discorda de nós, e não sucumbir às armadilhas que levam a desumanizar o adversário ou a desconsiderar vozes dissidentes. Mas não sei como.