#001927 – 06 de Setembro de 2024

Algumas pessoas convenceram-se de que tudo o que é mais relevante na sua vida foi por elas conquistado. Que o mérito é apenas delas: que são o argumentista, realizador e protagonista de tudo o que de notável lhes aconteceu. Estas pessoas têm-me parecido mais permeáveis a um tipo de insensibilidade: a falta de compaixão que considera que quem falhou, não atingindo as mesmas proezas de empreendedora auto-construção, só a si mesmo pode culpar. Nisto, talvez a discussão sobre o livre arbítrio possa ajudar. Diz Sapolsky que em tantas coisas a ciência descobriu a causa que leva a um efeito e que o resultado tem sido o de as sociedades se tornarem mais humanas. Dá exemplos como deixarmos de queimar mulheres porque as culpávamos de bruxaria num ano de colheitas desastrosas, deixarmos de considerar que os epilépticos estavam possuídos por demónios, deixarmos de culpar as mães de esquizofrénicos de não os amarem e dessa falta de amor causar a esquizofrenia. Quero acreditar que os avanços na ciência terão um efeito assim. Mas em tantas coisas considero que as mudanças têm de ser políticas, que descobertas científicas não desencadeiam automaticamente o que o poder político consegue impedir.